terça-feira, 30 de agosto de 2011

Em busca do assunto perdido

Assusto-me ao ver que já quase três meses são passados desde as últimas linhas que aqui postei.


Com certeza não foi por falta de assunto, antes por excesso do mesmo. E esse talvez seja o meu maior problema: tudo é muito rápido, superficial e descartável que também eu acabo me tornando sobretudo descartável.


Para o ser escrevente isso é péssimo, uma vez que todos os assuntos passam a ser altamente desimportantes e sempre há alguém que já dedicou algumas linhas ao tal do assunto que de fato não se sabe qual seja.


Assim, todos os dias, logo cedo, luto como um moderno Dom Quixote contra os assuntos que se fazem de difícil ou, o que talvez seja ainda pior, contra os assuntos sobre os quais eu não quero perder uma linha sequer.


Uma das características mais demolidoras desses nossos tempos agilizados é a sensação de absoluta inutilidade e inoperância. Saliento aqui a palavra sensação, pois de fato inoperante é a última coisa que posso dizer a meu próprio respeito nesses últimos quase três meses.


Só de fotos foram mais de 7.300, quilômetros trilhados a pé alguma coisa em torno 150 km podendo ser um bocadinho a mais, quilômetros percorridos com algum meio de transporte por volta de uns 4.500. Olhando esses números, que até a mim parecem astronômicos, pergunto-me como posso me considerar inoperante?


Como dizem que uma foto vale por mil palavras, mas Millôr Fernandes constesta sabiamente com um "Diga isso sem palavras", vou tentar escolher sete fotos, ou seja, menos de 1% das mais de 7.300 tiradas durante esses quase três meses, tentando ver se posso assim resumir a minha ausência desse moderno veículo de comunicação durante esse período.


1. Foto de 04 de junho de 2011: Museu Elvis Presley em Bad Nauheim.
Imenso poster na parede do museu, mostrando Elvis em traje de gala nos portões da cidade.
2. Foto de 09 de junho de 2011: Edersee, uma das maiores represas da Alemanha para cuja existência vários vilarejos foram inundados no início do século XX. 

O muro da represa. Como se pode ver, com um nível de água bastante baixo. Esse nível no decorrer do último verão baixou bem mais ainda.

3. Foto de 15 de junho de 2011: Saalburg, fortificação romana no Limes no estado de Hessen.

Essa fortaleza foi reconstruída no começo do século XX e é considerada um dos melhores museus da presença romana acima dos Alpes. Integra o patrimônio histórico da UNESCO "Limes".
4. Foto de 04 de julho de 2011: Rio Mosela em Bernkastel-Kues

Uma das regiões mais lindas da Alemanha.

5. Foto de 28 de julho de 2011: o laguinho do jardim

Home sweet home.
6. Foto de 10 de agosto de 2011. O presente que me dei ao completar 60 anos: Paris!

Catedral de Notre-Dame.
7. Foto de 13 de agosto de 2011: TGV, o trem mais rápido do mundo, em Paris antes da partida para Frankfurt.

Paris, eu voltarei, com certeza!

quarta-feira, 1 de junho de 2011

A magia de uma foto

Gosto de fotos e gosto ainda mais de fotos antigas. Dia desses, passeando pelo site de minha antiga escola, deparei-me com uma foto mágica, que teve o dom de me transportar para tempos idos e vividos que jamais voltarão e só existem na lembrança de quem os viveu.


Para ficar mais clara a história, coloco aqui a foto, que peguei no site:
Uma foto mágica
Essa foto é de 1967 e foi tirada no lançamento de um livro de poemas da autora Leila Gouvêa, que vem a ser a irmã da garota sorridente à direita na foto, Célia Gouvêa. Dizer que Célia foi colega de minha irmã mais velha no clássico é muito banal para descrever um relacionamento que envolvia ainda outras três meninas. Estudavam e estudavam e estudavam. Quando não estavam na casa da uma estavam na casa da outra e assim por diante.


Rever esse sorriso de Célia foi para mim reviver aquela época, rever na minha lembrança aquelas meninas na minha casa estudando e estudando, aquelas conversas tão profundas que me fascinavam, já que eu era mais nova e não podia atrapalhar e muito menos ainda participar.


Um tempo em que éramos ingênuas, um tempo em que tínhamos ideais, um tempo em que estudávamos em uma escola de elite, termo que na época nem existia e tão pouco tínhamos noção de quão especial foi aquela escola. 


A pessoa no lado esquerdo da foto é a professora de filosofia da turma. Uma pessoa especial, com o dom da didática que hoje em dia se procura por aí como agulha em palheiro.


Mas, o tempo passou e a roda-viva levou consigo os sonhos, as ilusões e os ideais. Mesmo a escola não existe mais. Há lá um prédio tombado pelo patrimônio histórico, que recentemente foi restaurado, abrigando uma escola estadual de segundo grau que decididamente nada tem a ver com aquele Colégio no qual estudei.


Célia nunca mais vi, mas sei que se tornou uma coreógrafa de renome internacional. Tem também um site próprio, basta clicar para lá chegar.


A história da professora de filosofia terminou tragicamente. Para quem se interessar, muito bem escrita no livro de Maitê Proença "Uma vida inventada: Memórias trocadas e outras histórias."


Mas na foto mágica nada disso existe. Existem duas mulheres muito de bem com a vida numa época histórica tremendamente especial.


Quem viveu, viveu, quem não viveu não vai entender nunca porquê se chora de saudades dessa época. 

segunda-feira, 23 de maio de 2011

Passeio de domingo

Gosto de andar e domingo é um dia que se presta especialmente a essa atividade. Sol e calor e lá me fui rumo aos campos, o que eu nessa época do ano não deveria fazer, já que sofro de uma rinite alérgica, também chamada febre do feno, que não dá febre coisa alguma, mas faz espirrar, lacrimejar, tossir e correr o nariz. Sem contar a falta de ar que acaba acompanhando esses sintomas.


Mas sou teimosa e vou assim mesmo. De saída fiz um erro que já fiz mais vezes: não levei o GPS por já ter feito o caminho mais vezes, o que resultou como sendo não totalmente correto, uma vez que apenas uma parte do caminho era conhecido. Da próxima vez prometo levar o GPS para registrar a trilha completa.


As vacas descansando na sombra.
Nesse ponto, onde encontrei as vacas, começou a subir, o que para mim é sempre péssimo.


Mas, depois de subir e subir, seguido de mais um tanto de plano, cheguei ao destino do meu passeio: uma corrida de carros entre o nada e o coisa alguma. Na verdade construíram essa pista entre a linha férrea de alta-velocidade e a auto-estrada. Normalmente essas duas vias de transporte correm paralelas uma à outra, mas em alguns trechos ficou um espaço entre ambas e aqui foi então feita essa pista.


Daubornring entre a Auto-Estrada A3 e a linha férrea de
alta-velocidade que une Colônia a Frankfurt am Main.
Um calor escaldante, cheio de barraquinhas e, para ser sincera, achei que tinha muito pouca gente para um acontecimento desses no meio da zona rural.


Linha de chegada e de partida
Uma barulheira infernal, os carros espirando pedras e barro para tudo quanto é lado, mas aparentemente o povo estava curtindo aquilo. Já passava das quatro da tarde e o tanto de sanduíches que estavam lá empilhados em uma das barraquinhas mostrava que os patrocinadores estavam esperando bem mais gente para olhar aquela fantástica corrida rural.


Poucas pessoas se interessaram pela corrida
Dei a volta por todo o circuito e levei um banho de pedrinhas e barro por chegar perto demais da curva onde os carros entrava mais tortos do que outra coisa.
Cuidado na curva!
Depois de cada bateria vinha um caminhão borrifar água na pista.
Caminhão pipa!
Mais uma bateria se forma na largada.
291: Os caras selvagens!
E foi dada a partida para mais uma bateria que nem bem saiu já parou. Deu selvageria na largada:
Acabou-se a brincadeira.
E assim veio o trator levar o Gerd embora para que a corrida pudesse ter continuidade:
Bye, bye, Gerd.
Depois de mais duas tentativas, finalmente partiu a bateria - acho que isso chama bateria só porque os carros batem entre si, né? - que no final tinha só ainda quatro carros.


Achei aquilo tudo muito chato e fui-me embora, de volta para os campos, onde acho que meus olhos se alegram tanto com a paisagem que quando cheguei em casa estavam inchados e vermelhos da malvada da rinite alérgica:
Como é verde e amarelo o meu vale!

sábado, 14 de maio de 2011

A história desprezada ou a morte de um cemitério

Uma das coisas que mais me fascina aqui na Alemanha é o respeito e cultivo pela história. Mesmo que durante algum tempo, períodos da história mais recente foram varridos para baixo do tapete, mais cedo ou mais tarde surge alguma iniciativa privada que vai recuperá-la. Sou tentada a aqui mostrar uma série de exemplos, mas o meu objetivo hoje é tentar contar uma outra história: a história de um cemitério histórico, totalmente desprezado e caindo aos pedaços.


Logo na entrada uma placa:
Limeira, 18 de outubro de 1987.
Trata-se do Cemitério do Bairro dos Pires em Limeira, Estado de São Paulo. No link uma curtíssima história do Bairro. Aliás que esse bairro não deixa de ser uma espécie de testemunho de que os contratos de parceria não foram destituídos de correção, uma vez que os fundadores desse Bairro são ex-colonistas da famosa Colônia Senador Vergueiro da Fazenda Ibicaba.


Historicamente esse bairro deveria constar bem no topo de qualquer obra que trate de alemães no Estado de São Paulo, sobretudo dentro da História da Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil: O Bairro Pires de Limeira foi a primeira Comunidade Luterana no interior (e quiçá no estado inteiro) de São Paulo a ter um pastor sob contrato. Mas isso também é uma outra história.


Evangelische Kirche - Bairro dos Pires - Limeira
Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Bairro dos Pires 
Fundada em 1873.
O Cemitério localiza-se pouco antes de se chegar à Igreja. Aliás que chegar a esse Bairro é quase que uma aventura, pois não tem asfalto e nem sinalização. Algo quase impensável para o Estado de São Paulo, sobretudo considerando que essa localidade fica a 150 km de São Paulo e a 60 km de Campinas, sem contar que se trata de uma das regiões mais desenvolvidas e assim mais ricas do país.


Logo na entrada do cemitério a placa acima, que faz com que se imagine que uma restauração ocorrida há quase 25 anos de fato conserve alguma coisa. Mas, além da placa, nada mais se encontra conservado. 


Vista da entrada do cemitério 
À medida que vai se caminhando para dentro do cemitério, mais a gente se choca com o desleixo:


Inúmeros túmulos têm esse aspecto.
Em sua maioria os túmulos são em mármore e as incrições em alemão. Inscrições preciosas, que com singelas e curtas palavras resumem uma história de vida:
Aqui, na fria terra, descansa Dorothea Marie Jurgensen,
nascida em Holstein em 2 de junho de 1828, falecida em 5 de abril de 1895.
 Suavemente descansem suas cinzas.  
A sujeira impera.
Se isso fosse aqui na Alemanha, já há muito tempo teria sido formado um grupo interessado em recuperar essa história e não deixar o cemitério também morrer: esse, infelizmente, ninguém vai poder enterrar e já se encontra no melhor dos caminhos para se tornar cinza.


Será que se eu fundar uma ong para salvar esse cemitério da morte certa encontraria pessoas interessadas em ajudar?

sábado, 7 de maio de 2011

Despedida de solteiro

Ontem fui a uma despedida de solteiro. Não é a primeira vez que vou a uma festa assim por aqui, mas ainda não me acostumei com a coisa.


Começa que foi uma festa de despedida de solteiro meio às avessas, já que o casal está casado no civil já há mais de um ano e vive junto há séculos. Mas, como sábado que vem é o casamento religioso penso que tal seja o motivo para também haver a despedida de solteiro.


Na despedida de solteiro você leva louça velha e quebra na frente da casa dos noivos. Um costume meio bárbaro a meu ver, pois até hoje não entendi e ninguém soube me explicar de onde vem um costume desses. Aliás que isso deve ter a ver com o nome da festa em alemão "Polterabend" que se traduz literalmente como "Noite de atirar longe", remetendo ao costume de atirar as louças para que os cacos tragam sorte.


Não há convite oficial para uma festa dessas, vai quem quer e conhece os noivos. Como a gente mora num vilarejo, todos conhecem todos e assim todos foram lá atirar louça velha na frente da casa do casal.


Em agradecimento havia então um comes e bebes na séde do Clube de Pesca, onde de fato foi toda a população do vilarejo. Grandes, pequenos, médios, velhos, jovens, enfim, tudo  que se espera de uma sociedade normal.


Essas reuniões no vilarejo sempre me remetem à minha infância onde também havia reuniões com tantas gentes, onde também havia sempre umas três gerações de cada família e a vida seguia devagar e monotonamente. É o que eu achava naquela época.


Hoje em dia sou feliz por morar no vilarejo, onde todos conhecem todos, onde se sabe da vida de cada um, e a vida tem um ar de normalidade monótona que na cidade grande há muito tempo não mais tem.


Eu acho que estou ficando velha ...


Eu quero uma casa no campo!





domingo, 1 de maio de 2011

Maio, mês das flores

Por cá o mês de maio é cantado em prosa e em verso, considerado o mês da primavera por excelência, o que, no entanto, não é bem correto.

Esse ano, onde tudo começou mais cedo (na verdade já o inverno começou quatro semanas antes do normal. Assim, nada mais justo do que a primavera também vir mais cedo, né?) e o mês de abril (que por cá dizem que faz o que quer) ter sido excepcionalmente quente e sêco, as árvores já floriram e as flores típicas da primavera, como os narcisos, também já floriram.

Assim, o negócio é esperar que depois de um mês de abril assim lindo, o mês de maio não nos decepcione, como foi o caso há quatro anos, quando o mês de abril foi o único mês "decente" no ano inteiro.

Nas ruas de Saint Blaise (CH)


Por aqui essa flor ainda não abriu!

sexta-feira, 29 de abril de 2011

Conforme o prometido

Voltei. E dessa vez devo ficar por algum tempo. Quanto tempo, não sei. Por mim iria andar para bem longe, mas no momento é mais sábio ficar por aqui.


Para quem achou que a foto do post anterior era na Europa, enganou-se. Aquela casinha encontra-se em Monte Verde, nas Minas Gerais.


Fui para a Suíça francesa. E cada vez que vou em um país onde se fala francês tenho raiva de mim mesma por não ter seguido o conselho de meus sapientíssimos professores da época que me recomendavam que estudasse mais francês pois tinha facilidade para aprender a língua. Naquela época eu estava só interessada em tirar a nota e não me interessava nem um pouco pelas histórias de Pierre Vicent.


Bem feito. Hoje em dia eu sofro para enteder o que as pessoas falam e fico que nem "mim Jane, You Tarzan" ou então falo para a pessoa falar bem devagar e respondo em inglês.


Na Suíça francesa tem-se a vantagem de muitos falarem alemão e na minha testa deve ter escrito que falo alemão pois os vendedores eram logo solícitos e falavam então alemão.


Aqui está uma foto que dizem que não se deve ficar tirando dos outros. Mas eu não me contive.


Pena que não aproximei mais.





quarta-feira, 27 de abril de 2011

E fuiiii ...

E agora estou indo. Um gerúndio para compensar que logo estarei voltando. E daí eu conto por onde fui.

Vou voltar ...
Sei que um dia ainda hei de voltar.

Onde será?

domingo, 24 de abril de 2011

Domingo de Páscoa

A partir de quando se é velho? Uma pergunta que parece não caber muito num domingo de Páscoa, onde sabidamente se festeja a ressurreição de Nosso Senhor, Jesus Cristo, que, aos 33 anos de idade, morreu crucificado para salvar a Humanidade de seus pecados.


Independentemente do fato de que nesses dois mil anos que nos separam da crucificação do Cristo o conceito de pecado ter mudado bastante, sendo que hoje em dia penso não haver mais pecado no mundo, pois tudo me é lícito (mas nem tudo me convém, já dizia o Apóstolo Paulo na primeira epístola aos Coríntios - 10:23), o fato de alguém ter morrido barbaramente na cruz para salvar a mim de meus pecados sempre me incomodou bastante.


Eu não queria que Cristo tivesse de morrer na cruz para me salvar de meus pecados, mesmo porque eu não sei quais são meus pecados e aquilo que em algum dia no remoto passado foi considerado pecado, hoje em dia é algo sancionado pela sociedade em geral e pelos indivíduos em particular.


Na imensa aldeia global em que se transformou o mundo não existem limites e nem fronteiras além daqueles determinados pelo próprio indivíduo. Leis existem para serem interpretadas e sábio é aquele que usa a lei a seu favor e o resto que se exploda.


Assim, não sabendo muito bem como refletir sobre pecado nessa linda manhã da Ressurreição, fiquei a me perguntar sobre a velhice e concluí que se é velho a partir do momento em que se sente mais saudade daqueles que já morreram do que daqueles que ainda estão vivos.


Passei então em revista meus mortos e meus vivos e concluí que devo estar na meia-idade. Ainda não tenho tantos mortos que fazem bater em mim uma baita saudade e os vivos de quem tenho saudades estão perfeitamente a meu alcance, apesar de muitos estarem distantes a horas de viagem.


Na sexta da paixão assisti a um curto documentário de Margot Käßmann onde ela dizia da morte como a grande mensagem da vida.


A biografia de Margot Käßmann é interessante, sobretudo para aqueles que se interessam pela relatividade do pecado. Nascida em 1958, estudou teologia luterana e em 1985 foi ordenada Pastora da Igreja Luterana. Casou-se com um pastor luterano e juntos tiveram quatro filhas. Depois de uma carreira fulminante onde se inclui um doutoramento, Käßmann foi eleita Bispa da Igreja Luterana de Hannover, o maior braço da Igreja Luterana na Alemanha, com mais de três milhões de membros. Em 2007 divorciou-se e nessa ocasião colocou o seu cargo à disposição, o que não foi aceito pelo Conselho da Igreja: divórcio não é motivo para renunciar a qualquer cargo na Igreja Luterana.


Em outubro de 2009 veio então o ponto alto de sua carreira: Käßmann foi eleita a primeira Presidente mulher do Conselho da Igreja Luterana da Alemanha, um cargo equivalente ao de Presidente da Conferência Nacional dos Bispos.


No dia 20 de fevereiro de 2010, por volta das 11 da noite, Käßmann ultrapassou um sinal vermelho no trânsito de Hannover e foi imediatamente controlada pela polícia. O exame de sangue mostrou que ela tinha 1,54 promille de álcool no sangue. Permitido é um índice de 0,5!


Dentro da idéia "atire a primeira pedra aquele que estiver sem pecado", o conselho da Igreja Luterana colocou-se completamente ao lado de Käßmann. Mas ela mesma não conseguiu viver com esse pecado e renunciou a todos os cargos que tinha dentro da Igreja Luterana. Simultaneamente perdeu sua carteira de motorista por um ano e foi processada por negligência pela condução de veículo automotor em estado de embriaguez e condenada a 30 dias de multa, que no caso dela deve ter dado uma boa soma, já que essa multa é calculada em cima do valor do salário da pessoa!


Depois de alguns meses nos Estados Unidos, onde lecionou teologia em Atlanta nos USA, Käßmann voltou à Alemanha onde, ao lado de algumas aulas em universidades, tem também moderado alguns programas de televisão, como esse da sexta-feira da paixão, onde fala da morte usando o caso de uma família que teve trigêmeos, dos quais somente um sobreviveu. Para quem entende alemão e se interessa, aqui o link para se assistir ao vídeo de 14 minutos.


Para que possa haver ressurreição, tem de ter havido antes a morte, o que de novo me remete a meus mortos, nesse domingo da Ressurreição. E a saudade bate, e as lágrimas caem, pois estou ficando velha e tenho de fato mortos que me fazem muita falta.


Uma mãe que chora a perda de seu filho, a Mater Dolorosa, imortalizada por Michelangelo, uma figura simbólica que não cabe num domingo de Páscoa.  


Pietá na Catedral de Frankfurt


A primeira Páscoa sem minha mãe, que morreu antes do Natal. Será que nos céus do Senhor também se festeja a Páscoa?




  





sexta-feira, 22 de abril de 2011

Páscoa

Por cá existem inúmeros usos e costumes na Páscoa, começando por guloseimas na padaria, passando por assados especiais e, não por último, terminando nos ovos de Páscoa.


Como disse ontem, sou convicta de que todos esses usos e tradições tem mais a ver com a primavera do que com qualquer outra coisa. Na pesquisa de um outro assunto, deparei-me com um livro de 1854, chamado Simbologia Cristã de um Wolfgang Menzel, que em seu tempo foi até conhecido crítico literário. Interessante que na lista de suas obras no catálogo da biblioteca nacional alemã não consta essa obra, em dois volumes. Mas, em tempos de Google Books, quem é que se interessa pelo catálogo da biblioteca nacional alemã?


Resolvi traduzir o texto que diz respeito à Páscoa, por ver lá escrito muito do que eu mesma penso a respeito:



Páscoa (em alemão Ostern)

Festa da Ressurreição do Senhor. A palavra alemã foi mantida de uma antiga festa da primavera pagã em honra à Deusa Eastre, Eostra, Ostara. Sob esse nome provavelmente pretendia-se dizer do sol que vem do leste (Osten). Ainda hoje o povo acredita que no domingo de páscoa de manhã o sol salta três vezes de alegria pela Ressurreição do Senhor.

Vem daí a tradição, em muitos lugares, de subir a um monte na noite santa da páscoa e lá esperar o sol nascer. 

O sol, como a luz original, muitas vezes foi comparado com Cristo, a luz original do espírito, assim também o nascer do sol com seu nascimento e sua ressurreição. Essa simbologia corresponde também à época na qual cai a páscoa.

A primavera é ao mesmo tempo a manhã do ano, assim como o inverno foi a sua noite. O sol da páscoa, depois das longas noites de inverno, é o real sol matinal do ano, com o simultâneo acordar das flores e dos pássaros e de toda a vida na natureza.

Em tempos mais antigos o ano começava na Páscoa, com a primavera. Assim também o ano litúrgico começava antigamente no dia 25 de março.

A Páscoa é simultaneamente a antiga festa do Passah dos judeus, que cai na mesma época e que pode ser remetida à mesma simbologia da natureza pois, mesmo os judeus festejando em sua páscoa apenas a libertação de seu povo do Egito, assim essa libertação da escravidão, festejada justamente na primavera, nada mais significa do que a libertação da natureza das garras do inverno.

A festa do Passah é fixa. A igreja cristã, no entanto, fez da Páscoa uma festa móvel, não apenas para diferenciar-se da festa judaica, mas para poder festejar a ressurreição sempre em um domingo. Dessa forma foi estabelecido que a Páscoa seria festejada sempre no primeiro domingo depois da primeira lua-cheia depois do equinócio vernal (21.03).

Na simbologia dos festejos da Páscoa, o cordeiro da Páscoa (Osterlamm) ocupa o primeiro lugar. Trata-se do mesmo cordeiro da Páscoa que os judeus abateram e comeram quando saíram do Egito, o que representa a origem da festa da Páscoa.

No entanto para os cristãos trata-se do Cordeiro de Deus, que tira os pecados do mundo. O cordeiro da Páscoa é normalmente enfeitado com a flâmula da cruz, assim como o próprio Cristo carrega essa flâmula exclusivamente em quadros representando a Ressurreição.

O cordeiro é identificado com o sol. Em Brandemburgo na manhã da Páscoa, antes do nascer do sol, pega-se um recipiente com água e  na hora do nascer do sol espelha-se nela um cordeiro branco. Aqui percebe-se nitidamente como antigos cultos da natureza foram integrados na tradição cristã.

A festa da Páscoa é uma imensa festa da luz, pois a partir daí os dias ficam mais longos e se inicia a alta temporada da primavera e do verão, o que convenientemente se traduziu como a iluminação do mundo pelo cristianismo. Como o sol da Páscoa é uma alegoria para o próprio Cristo, assim também a fogo da Páscoa, a luz da Páscoa, a vela da Páscoa e o óleo da Páscoa.

Até os tempos modernos foram acendidas fogueiras nos morros. Saltava-se sobre elas, fazia-se com que os animais passassem rapidamente sobre ela, corria-se com pedaços de madeira em chama em torno dos campos já semeados. Rolava-se uma roda de fogo de cima do morro ou atiravam-se pedaços de madeira em chamas sobre os campos semeados, para assim abençoá-los e protegê-los contra danos. Guardavam-se as cinzas do fogo da Páscoa para proteger-se contra todos os tipos de malefícios.

Provavelmente antigamente se apagavam todos os fogos no sábado de alelulia para reacendê-los na sagrada noite da Páscoa com o nascer do sol. Essa tradição manteve-se pelo menos nas igrejas. Nas festividades da santa noite da Páscoa todas as velas são apagadas e acesas novamente somente de manhã, o que de acordo com a antiga crença aconteceu por um milagre no santo sepulcro em Jerusalém.

A crença de que na manhã da Páscoa as velas nas igrejas por milagre são acesas por luzes que vindas do mar ou do ar flutuam para dentro das janelas, é também presente em outras situações.

Um ritual comum na igreja católica é na Páscoa renovar-se todo o óleo usado na igreja. O óleo antigo é queimado, o que se denomina "queimar o Judas".

Além disso a grande "Vela da Páscoa", também denominada "Luz da Páscoa", uma imensa vela de cera, muitas vezes colorida e enfeitada, serve para acender todas as outras velas, sendo que também o povo faz fila para acender uma pequena vela para com ela ter um fogo abençado para o seu fogão doméstico.

Essa "Luz da Páscoa" queima pela primeira vez na noite da Páscoa. É comparada com a Coluna de Fogo que iluminou o caminho dos Judeus na sua saída do Egito. Mas, para diferenciá-la e torná-la cristã, ela é colocada na água do batismo. O novo óleo destinado ao serviço eclesiástico é consagrado já na quinta-feira santa.

A consagração da luz na Páscoa corresponde à consagração da água. Na Páscoa toda água é consagrada, o que acontece com especial festividade na igreja grega.  O patriarca dirige-se ao rio mais próximo e o abençoa. Na igreja romana somente a água benta e do batismo é abençoada.

No entanto, credita-se também à água da Páscoa para o uso particular uma bênção maior do que à água comum, e assim, no âmbito de festividades antigas, busca-se essa água já de dia ou, contra a corrente por uma mão virgem, sendo que sem dúvida entram aqui antigas tradições pagãs.

Entre jovens o jogar da água da Páscoa uns nos outros, que hoje em dia é uma brincadeira, tem provavelmente sua origem também em uma espécie de bênção.

Dentro da simbologia da Páscoa existe ainda o ovo da páscoa, a bola da páscoa, a panqueca da páscoa, todos três redondos, simbolizando a terra redonda e a fertilidade da terra que se inicia com a Páscoa, mas na tradição cristã aplicada à ressurreição de Cristo.

O ovo da Páscoa é inicialmente um símbolo do Redentor fechado dentro de um túmulo. A brincadeira muito antiga com ovos de Páscoa consiste em que duas pessoas batem seus ovos coloridos uns contra os outros, o que deve significar a Ressurreição da vida de dentro do ovo.

Muitas vezes os ovos são esvaziados e inseridas pequenas figuras, como o menino Jesus na manjedoura, um pequeno crucifixo, etc. Na pintura e no recheio dos ovos esgotou-se a criatividade e muita coisa de mau-gosto instalou-se. Mas já no tempo dos pagãos o ovo era o mais natural e óbvio símbolo da vida aprisionada na terra endurecida pelo inverno, que renasce na primavera.

Ao colorir os ovos, pensou-se talvez no sangue de Cristo ao se usar a cor vermelha, mas nas muitas outras cores pensou-se provavelmente no novo enfeite da primavera: as flores.

A panqueca da Páscoa é um bolo redondo, que se assa na Páscoa e antigamente se levava para os morros, para comê-lo ao nascer do sol. Provavelmente uma alegoria para a terra que a partir da páscoa novamente se torna fértil e traz alimentos.

A bola da Páscoa, com o qual crianças e virgens brincam na Páscoa, é provavelmente também proveniente de algum festejo pagão da primavera, simbolizando o sol no céu, que agora raia durante mais tempo. 

Considerando que a Páscoa é a manhã da ressurreição do Senhor, é óbvio que três dias antes é a sexta-feira da Paixão e cinqüenta dias depois a Epifânia. Todo o ciclo da Páscoa e Epifânia, iniciando-se com a quaresma, tem sua origem nas sagradas escrituras. No entanto parece que muitos usos e costumes da quinta-feira-santa são originários de uma antiga festa da primavera pagã, relativa às primeiras tempestades, às primeiras ervas, aos primeiros ovos, etc, o que não iremos tratar especificamente por não se tratar de simbologia cristã.

Christliche Symbolik
Wolfgang Menzel
Seite 175-180 
Regensburg 1854         
   
E assim, como hoje é sexta da Paixão, aproveitei para colocar uma nova Via Crucis em meu fotolog. Clicando na foto você pode ver as catorze estações da Via Crucis da Igreja de São Paulo de Munique.
Via Crucis  2011

quinta-feira, 21 de abril de 2011

Semana Santa

Amanhã é sexta da paixão, um dia que promete ser magnífico, com temperaturas acima de 25°C o que é bastante para essa época do ano.


Nova vida!
Continuo achando que a Ressurreição nada mais é do que a natureza voltar a viver depois de um inverno brabo!


Mas, como para poder haver a ressurreição tem de ter primeiro a sexta da paixão, nada mais justo do que essas festividades todas serem na primavera.


Bom feriado a todos!

terça-feira, 19 de abril de 2011

Sobraram 45 horas!

Ausentei-me por alguns dias e cá estou de volta, mas é por pouco tempo. Quanto tempo, não importa, importante é saber que vou-me.


Para onde, pergunta decerto o curioso leitor. Não sei ainda. Mas sei que irei. Vontade tinha eu de entrar numa cápsula do tempo e enfiar-me lá no remoto século XIX.


Isso me remete à presença de ali quando me ausentei daqui. Pois que ali eu tive uma interessante conversa a esse respeito de século XIX.


Pois que o assunto era o tempo que se gastava para ir de A até B. No livro que estou lendo, o herói, montado a cavalo, leva 48 horas para percorrer uma distância que hoje, indo-se devagar, leva-se no máximo três horas, o que faz com que sobram 45 horas para se fazer qualquer outra coisa.


Mas, o que se faz hoje em dia com essas 45 horas que sobraram da viagem? Quando disse a meu interlocutor que achava que as pessoas no século XIX aproveitavam melhor o tempo e até tinham mais conhecimento do que nós hoje em dia, recebi um veemente protesto.


Disse-me o interlocutor que hoje em dia temos muito mais conhecimento implícito do que, por exemplo, esse meu herói do século XIX que andava no lombo do cavalo sem conhecer o automóvel, coisa que hoje em dia qualquer um conhece.


Para poder constatar essa assertiva procuro uma cápsula que me leve até esse meu herói para que eu possa com ele trocar umas idéias e, se for o caso, trazê-lo até aqui para ver o que ele faria com as 45 horas que sobraram da viagem.


Enquanto eu não acho essa cápsula contento-me em ficar procurando um lugar para ir nos próximos dias.


Quando encontrar eu aviso, tá?


Com esse a viagem seria mais devagar ainda.

sexta-feira, 15 de abril de 2011

quinta-feira, 14 de abril de 2011

Uma nobre profissão

Você sabe o que é um carteirista?

Até há relativamente pouco tempo eu não tinha a menor idéia do que era um carteirista e, se perguntada fosse, iria dizer que decerto se referia a alguma nobre profissão educacional, o que não deixou de ter a sua correção.

Tive o imenso desprazer de ser confrontada com a atividade desse nobre profissional quando estive pela primeira vez em Portugal, mais exatamente em Lisboa.

Pois que entrei no bonde, que por lá se chama eléctrico, na Praça do Comércio para ir a Belém, visitar o Mosteiro dos Jerônimos e comer dos famosos pasteizinhos que na verdade parecem antes empadas doces, ou seja, um programa mais de turista impossível.

O eléctrico chegou e todos os turistas, que não eram poucos, ficaram se empurrando para entrar no bonde. Como sardinhas enlatadas ficamos nós, pobres turistas, o que facilitou em muito a ação do carteirista, que também estava no elétrico, mas desceu logo na próxima estação, levando consigo minha carteira, onde não havia dinheiro algum, mas todos os meus documentos e mais cartões de crédito e de banco.

Deu-se então o inusitado, aquela seqüência de acontecimentos cujo produto final é rotulado de milagre.

O carteirista desceu na estação e jogou a carteira num cesto de lixo, o que foi visto por um motorista de táxi que tinha ponto naquela estação.

Entre os documentos que havia na carteira encontrava-se também o cartão funcional do meu trabalho. O motorista de táxi viu esse cartão e sabia que seus fregueses de um escritório ali na praça trabalhavam com a empresa cujo nome estava estampado na minha carteira funcional.

Foi lá e falou com sua conhecida que por sua vez ligou então para a filial do meu empregador em Lisboa.  A funcionária de Lisboa olhou então na lista telefônica interna da empresa e, veja só, de fato estava lá o meu nome e o número de telefone da minha empresa na Alemanha.

Como ela também falava alemão, não teve dúvidas e ligou para lá contando do ocorrido e de que haviam encontrado a carteira e coisa e tal.

Por mais um desses acasos inexplicáveis, na firma se sabia em que hotel eu estava.

Ao chegar ao hotel de volta do passeio, que no final das contas nem passeio foi, pois assim que me dei conta da falta da carteira começou o inferno de ir na polícia, bloquear os cartões e todas essas desagradabilíssimas coisas que se tem de fazer quando o carteirista entra em ação, sem te perguntar antes se pode, havia no quarto do hotel um telefax da minha colega de trabalho me passando o número de um telefone onde deveria telefonar para agendar a devolução da carteira. 

Atônita, sem acreditar muito no que estava lendo, telefonei para o tal número e, veja só, de fato uma simpática lusa me deu todas as coordenadas para que eu fosse então buscar a carteira no endereço assim e assado.

Mas, o meu anjo da guarda de plantão naquele dia provavelmente ainda não tinha tirado o diploma final no curso de milagres perfeitos, pois o dia era sexta-feira e o relógio marcava já 18 horas, com o que, a carteira iria passar o fim-de-semana trancada numa gaveta de um escritório lisboeta e só voltaria a meu poder na segunda-feira, que era o dia em que eu voltaria para casa. 

Só depois desse incidente é que eu entendi o que essa placa que se encontra em todos os eléctricos de Lisboa significa:

 

Ah, sim, antes que eu me esqueça, a simpática moça lusa disse-me ao telefone que desde que os brasileiros começaram a invadir Portugal, em função de algum acordo entre o Governo Português e o Governo Brasileiro, essa profissão desenvolveu-se com uma rapidez assustadora. Não acreditei muito nessa coisa, pois se assim o fosse, teria sido um batedor de carteiras e não um carteirista que havia levado a minha carteira, né não?