domingo, 24 de maio de 2015

Japão, cinqüenta anos depois. Parte I

Amanhecer em Frankfurt am Main no dia 23.04.2015
Eram seis e meia da manhã da quinta, 23 de abril de 2015, quando tirei a foto acima às margens do Rio Meno, a caminho do serviço. Ainda teria de trabalhar meio dia, para então pegar o avião que sairia às 13:40 do Aeroporto de Frankfurt am Main rumo ao Aeroporto de Nagoya no Japão.

"Mas por quê cargas d'água você quer ir ao Japão", não cansaram de me perguntar. Uma resposta definitiva eu não tinha, mas me deu vontade e isso para mim já é motivo mais do que suficiente.

De fato, um atávico motivo poderia até existir:

Há cinqüenta anos, lá no remoto ano de 1965, um ano bastante definitivo em minha vida, meu pai um dia chegou com a novidade: iríamos nos mudar para o Japão. Como já naquela época eu era fascinada por viagens e culturas diferentes, enchi-me de alegria: iria me mudar para um outro país.

Por qual motivo essa transferência não deu certo eu não sei dizer. Nunca me contaram e eu também não mais me interessei. A frustração foi grande e eu repeti de ano na escola. Se por conta da mudança que, no final das contas não aconteceu, eu não sei mais dizer.

Para a viagem ao Japão eu havia inicialmente escolhido a primeira semana de maio, em função do feriado, mas vendo melhor, resolvi antecipar por uma semana, pois um dos objetivos de minha viagem era ver e fotografar a florada das cerejas.

Assim marquei férias, reservei um hotel e marquei a passagem para o dia 23 de abril, com a volta marcada para o dia primeiro de maio.


Havia escolhido ficar a semana inteira em Kyoto. Por qual motivo? Nenhum motivo específico. Senti-me atraída pela cidade pelo seu patrimônio cultural da Humanidade e também por a florada da cereja de Kyoto ser famosa.
Últimos preparativos para o vôo LH736 (Franfkurt -> Nagoya) do dia 23.04.2015
Foi um vôo de 12 horas bastante tranqüilo, já que o avião estava praticamente vazio. Mas, no meio da noite, deu-se um hilário diálogo entre mim e o comissário japonês:

Comissário: A senhora tem família no Japão?
Eu: Não, senhor, não tenho.
Comissário: Mas a senhora vai se encontrar então com conhecidos no Japão?
Eu: Não, senhor, não tenho conhecidos no Japão.
Comissário: Então a senhora vai se juntar a algum grupo de turistas?
Eu: Não, senhor, não vou me juntar a nenhum grupo de turistas no Japão!
Comissário: Mas, o que então a senhora vai fazer no Japão?
Eu: (Em alto e bom som) Férias!
Comissário: Quer dizer que a senhora está indo para o Japão sozinha para fazer férias?
Eu: Exatamente.
Comissário: Mas porque o Japão?
Eu: Porque não conheço e quero conhecer.

O Comissário ficou com uma cara de quem nada entendeu, ar de espanto espantosíssimo e eu achei o diálogo no mínimo surreal. A comissária que estava ao lado ouvindo a conversa caiu na risada e disse que nunca tinha visto o colega conversar tanto e que não era de seu feitio fazer assim perguntas para as pessoas, mas tanto um quanto o outro acharam muito legal que eu fosse fazer férias no Japão sozinha. Tentaram me dar dicas sobre comida, muito simpático da parte deles, mas de nada adiantou. A comida é o meu calcanhar de Aquiles, mas isso já sei de outras viagens.

Ao chegar no Aeroporto de Nagoya a primeira surpresa: por todo o corredor um risonho Christiano Ronaldo cumprimentando as pessoas do alto de um cartaz repetido a cada cinqüenta metros e as placas indicativas eram também em língua portuguesa. Se por conta dos portugueses ou dos Dekassegui brasileiros eu não sei dizer. De qualquer forma a séde da Toyota – em 2014 o maior fabricante de automóveis do mundo – fica logo ali ao lado e penso que esse aeroporto seja então a porta de entrada dos trabalhadores estrangeiros dessa empresa.

O controle de passaportes foi sem maiores problemas, mas a mala foi controlada na alfândega. A impressão que tive é que todas as malas são controladas na alfândega. Mas também foi rápido e vi-me então no saguão do aeroporto, onde minha primeira providência foi tirar dinheiro local num ATM.

Novamente a surpresa: o ATM falava português! Assim, tirei meu dinheiro e o próximo passo seria então encontrar um meio de chegar a Kyoto.

Encontrei um guichê de venda de passagens e disse que queria ir a Kyoto, ao que o risonho japonês me disse que eu teria de primeiro comprar uma passagem até Nagoya e lá comprar uma passagem para Kyoto. Não dava para comprar tudo de uma vez pois eram companhias diferentes que faziam o trajeto e do aeroporto não saía nenhum trem direto para Kyoto.

Assim, lá me fui para Nagoya, num trem que só falava japonês e onde também só se encontravam japoneses.

Chegando na monstruosa estação ferroviária de Nagoya, quis dar uma de entendida e fui comprar uma passagem para o famoso trem-bala Shinkansen diretamente no automático.

Muito orgulhosa com minha passagem comprada lá me fui para a plataforma de embarque que se alcança passando por uma cancela como no metrô de Paris: coloca-se a passagem em uma ranhura e ela sai do outro lado e abre-se a cancela.

Só que a minha passagem não abriu cancela alguma. Saía do outro lado e nada. Eu já estava ficando alarmada, quando um simpático japonês, encarregado de controlar as entradas dos passageiros, me disse que estava falando um papel, ou seja, para eu poder passar teria de entrar com dois bilhetes.

Voltei correndo para o automático onde havia comprado a passagem, pensando que talvez tivesse esquecido a segunda parte na máquina, mas por lá nada havia. Fui então no guichê - onde deveria ter ido logo de cara - e contei da minha desventura, ao que o simpático japonês, em um inglês bastante rudimentar, me explicou que eu havia comprado apenas um assento para o trem e não a passagem! Ou seja, havia perdido o trem do assento, mas isso não se mostrou problema, já que ele me deu um novo assento e me vendeu a passagem que faltava.


Com isso eu fui feliz e contente para a plataforma de embarque, já que com as duas partes a cancela abriu-se feito um Sésamo.


Vista da plataforma de embarque em Nagoya

O trem não pára entre Nagoya e Kyoto e em quarenta minutos cheguei na estação de Kyoto. Para quem já andou de TGV e ICE, o Shinkansen não oferece grandes novidades. Mas é um grande conforto e uma experiência imprescindível.
Foto tirada a 300 km/h
A paisagem passa tão depressa que mal dá para se fotografar alguma coisa.

Chegando em Kyoto, resolvi ir pelo meu tradicional caminho, qual seja, procurar usar os meios de transporte público de uma forma barata.


Ainda em Frankfurt eu havia me informado em uma Agência de Turismo japonesa sobre o passe de trem de validade de sete dias, a módicos 300 €. A simpática japonesa me perguntou qual roteiro que eu pretendia fazer, ao que lhe disse que chegaria de avião em Nagoya e de lá iria para Kyoto e a mesma coisa de volta. Perguntou-me se eu pretendia viajar pelo Japão de trem, ao que eu lhe disse que não, que iria ficar somente em Kyoto. Fez-me uma conta e disse que não valia a pena gastar 300 € para um passe que eu não iria usar. As passagens de trem que eu teria de pagar seriam menos da metade do preço. Devo dizer que esse passe de trem só se pode adquirir fora do Japão. Uma vez lá estando, não dá para comprar mais. Eu decidi então não comprá-lo, mesmo porque ele não dá direito a se viajar com o trem-bala e isso eu queria fazer de qualquer forma.
Estação Ferroviária de Kyoto

Interior Estação Ferroviária de Kyoto

Assim, cheguei eu na estação de Kyoto. O prédio é tão majestoso que lá dentro existe até uma maquete dela feita de lego.

Maquete da estação de Kyoto
Fui então em busca de uma possibilidade de andar de transporte público local, com o que cheguei no Escritório de Turismo da cidade que fica dentro da estação. Lá vi que havia a possibilidade de se comprar por dois mil yens um cartão válido por dois dias. Junto vem um mapa com todos os pontos de parada de ônibus, metrô e vai por aí afora.


Com esse cartão dirigi-me então ao hotel que havia reservado. Duas estações de subway e duas quadras a pé.


Primeiras impressões
Primeiras impressões
Entrada do hotel (onde está entrando o senhor de verde)
Cheguei sem maiores problemas ao hotel por volta do meio-dia. A simpática mocinha da recepção disse-me porém que eu não poderia entrar no quarto antes das três. Fazia um tremendo calor, com o que troquei de roupa, larguei a mala no saguão e fui andar.


Primeiro passeio
Bicicletas por todo lado
Senti-me uma perfeita analfabeta
Tudo tão diferente


Mais bicicletas

Pelo menos não vou passar fome
Bicicletas e mais bicicletas


Impressionante
Eu já estava mais do que encantada com tudo o que estava vendo, quando me deparei com meu primeiro templo em Kyoto.

Há que se considerar que Kyoto possui 1.600 templos budistas e 400 templos xintoístas. De 794 a 1869 foi a capital do Império Japonês e na Segunda Guerra estava em primeiro lugar na prioridade das cidades que deveriam ser bombardeadas com a bomba atômica. Graças à intervenção do Ministro da Defesa Americano, Henry L. Stimson, que havia visitado a cidade antes da guerra, foi retirada da lista.


Chōzuya ou temizuya xintoísta para a purificação

Sem legenda!

Templo Shoukou

Lateral

Entrada

Não consegui ler

Lugar para se encaminhar os pedidos
Lindo jardim
Depois de almoçar um Cesar Salad continuei meu passeio, pois ainda não havia dado a hora de voltar ao hotel para o check-in.
Vitrine de moda ocidental para noivas japoneas!

Canal

Ruela atravessando o canal

que desemboca em um rio

À beira do rio

Voltando ao hotel
Chegando de volta ao hotel, a simpática mocinha da recepção deu-me então as instruções e perguntando se eu queria café-da-manhã, que não era incluso na diária. Disse-me que se eu reservasse o café-da-manhã com ela pagaria 700 yen, se resolvesse no dia seguinte direto no restaurante, pagaria 800 yen. Disse-lhe então que iria reservar para um dia, pois queria experimentar. Se desse certo voltaria para reservar os demais dias.

Fui-me então para o quarto no sétimo andar, morrendo de cansada, pois já estava cerca de 24 horas sem dormir, já que não consigo dormir no avião.


O quarto era um espanto: minúsculo mas grande ao mesmo tempo. Penso que os japoneses sejam os campões mundiais em aproveitamento de espaço.

Uma cama de excelente tamanho
Interessante o travesseiro: de um lado duro e do outro lado menos duro. O colchão também por demais de confortável. A lateral praticamente substitui um armário. 
O show: uma máquina de lavar roupa
Maravilhas da modernidade: num quarto minúsculo ainda tem lugar para uma máquina de lavar roupa. Para secar havia no banheiro uma cordinha enrolável que vai de um lado ao outro no chuveiro.
Tábua de passar calças. 
Você acerta a calça, coloca as pernas aí dentro e aperta um botão. Em alguns minutos a tua calça está passadinha e com vinco!
Um umedecedor que não sei como funciona. Esse só falava japonês e nada entendi.

Frigobar, onde só havia uma garrafa de água que todos os dias era renovada. Fazia parte da diária.

O banheiro também pequeno, mas de tamanho mais do que suficiente.

Várias opções.

Espaço muito bem utilizado.
E assim terminou o meu primeiro dia no Japão. Dormi como uma pedra, já que a cama era por demais de confortável.





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